Blog da Mota: Ao longe observo o mar

quinta-feira, outubro 25, 2007

Ao longe observo o mar

Ao longe observo o mar, hoje esta pintado de prata, tão fino e sedoso, esta distante de mim, mas parece que consigo sentir o seu brilho, esta tão brilhante hoje, quase se pode dizer que o mundo é perfeito.
Observo este mar, com olhos de poeta, estes olhos que viram já tantas maravilhas, tantas paisagens inesquecíveis, mas por muito que observem algo belo, já mais se deixam de se espantar, com beleza que é o mar que observo.
E finalmente invade em mim uma paz, o meu espírito inquieto sossega com o chamamento das ondas, aquelas que agitam suavemente o horizonte, fazem me viajar por memorias infindáveis, por vezes sem nexo, pois a beleza desse mar não me deixa pensar em mais nada.
Atravesso a praia que tantas vezes me deitei, viajei, sem rumo para sítios onde só eu posso chegar, onde falo com objectos e bichos, que respondem ao meu chamamento, eles percebem o que digo, é nesses sítios onde posso encontrar o meu verdadeiro EU, sem problemas, nem filosofias, só mente eu e o meu espírito, temos conversas, que não têm sentido, mas mostram quem eu sou.
Com um gesto gentil e despreocupado, passo a mão pela areia, está fria, estes últimos dias impiedosos de Outono trazem o frio, o cinzento, e um mar que se enfurece rapidamente, mas não me importo, mais cinzento que a minha própria existência anda estarei para descobrir, gosto do frio, e o mar hoje encontra-se calmo, pois não tem pressa, ele sabe que o dia acaba rápido.
A imponente capela apresenta-se com um ar austero, fria, no cimo das suas rochas, batidas até á sua destruição pelo mar impiedoso, mas estas não procuram a sua piedade, renegam esse sentimento de pena, pois apenas querem desfrutar todos os dias do mais maravilhoso que o mar tem para lhes oferecer, a sua fúria.
O sol, esse já vai baixo, outrora, a sua luz iluminava toda esta praia, agora deserta, deixando ver todo o brilho cintilante que a areia imana, dá voz ás dunas mudas, calcadas e profanadas pela gente que vê com olhos de ver e não com os olhos de sentir.
Mas agora, desistiu, deixou-se render, não tem mais força para iluminar o mal que esta patente neste mundo belo, neste mundo que destrói, e sem remorsos passa por cima daquilo que mais belo a terra tem para nó oferecer, agora esse sol apenas tem força para iluminar o céu, tingi-o de laranja, mas por pouco tempo, quando lhe prestarmos atenção, já este se deitou, e a escuridão abateu-se sobre o céu e sobre a terra.
Sento-me sobre as pedras silenciosas que gritam, mas só eu as posso ouvir, tento escutar, mas o seu berro é afogado pela fúria das ondas, a violência do seu embate faz com que possa sentir as minhas próprias vibrações, faz com que a música, que está dentro de mim se espalhe por esse oceano que foi prata mas que agora tem pequenos traços de um laranja solto, solto porque já não tem forças para continuar vivo.
Ao ver, ao ouvir, todo o que a natureza me diz e me mostra, não consigo deixar de pensar o quanto são fortes as palavras que aqui escrevo, as palavras que serão ignoradas, esquecidas, são proferidas sem destino por uma mente sem rumo, uma mente perturbada pela sua própria escrita, uma mente que se encontra pensativa, sentada numa rocha a ver o sol a desaparecer no céu.
E é nesse momento que a fúria se abate sobre o meu ser, sem aviso prévio, sem bater a uma porta tantas vezes arrombada por sentimentos que jamais esquecerei, é essa fúria que acaba com a voz das rochas, o chamamento das ondas, e a música que a mente fazia ouvir.
A fúria aumenta a medida que me vou apercebendo que a vida que vivo, a vida para a qual trabalho, a vida para a qual sem sentido, dou todo o que tenho, e em troca nada recebo.
O medo entra pela porta deixada escancarada pela fúria, este traz-me o fantasma da solidão, trás a violência da visão de uma rotina, a visão de uma vida sem sentido, uma vida de em que as palavras e os sentimentos não fazem sentido, uma vida para a qual eu trabalho todos os dias.
O meu espírito, aterrorizado encosta-se mais á rocha dura, que me protege da fúria do mar, espero que ela me proteja também dessa vida, mas sei que ela não o poderá fazer, sei que depois daquele momento voltarei para o sitio onde chamo casa, para as pessoas que chamo família, continuar a trabalhar para aquilo que continuo a chamar de vida.
Mas no horizonte deslumbro o meu amor, fixo-me nela, esta tão bela hoje, faz-me um sorriso que afasta a nuvem negra que consome o meu espírito, e com um gesto simples e encantador ilumina de novo toda a praia, dá de novo voz ás dunas, acalma o mar, e reconforta a minha alma.
O meu amor já vai alto no céu, sorrio para ela, chamo por ela, e ela acaricia-me com ternura, é nesse momento que sei que para onde quer que vá ela estará lá para me mostrar que ela eu posso amar, com ela posso sentir, falar, porque sei que ela sempre me amara.
Nesta visão da lua, decido regressar, decido prosseguir, em busca de algo, do que é ainda não sei, mas sei que tenho de continuar á procura de um sentido para mim, pois não poderei ali ficar, em breve o meu amor será engolido pelas nuvens e a solidão voltara ao meu espírito.
Infelizmente não poderei viver ao som de uma guitarra nem é luz da lua, pois sei que essa perfeição não se destina a um imperfeito como eu, penso que é isso que procuro, a perfeição, para que assim poder viver.

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